sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Ausência


Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Carlos Drumond de  Andrade


segunda-feira, 26 de setembro de 2011

O haver






Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe. 

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza 
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história. 

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa 
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.

Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa 
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade 
De aceitá-la tal como é, e essa visão 
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...

Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.



Vinícius de Morais



sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Eu.


Sabe...Já fiquei TANTO tempo sem me conhecer, adormecida e sem vida...que hoje, o simples fato de me olhar no espelho me faz...SORRIR!





Karla Morgana







segunda-feira, 19 de setembro de 2011


É, todas as tardes ela insiste em aparecer...Mesmo não sabendo se ouvirá sua canção favorita...Neste céu laranja...


Karla Morgana

E se...


Nesta dança, busco os passos mais leves...Uma dia, caso me encontres, traga um balão vermelho...e verás um brilho em meu olhar ao segurar-te a mão...

Karla Morgana

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Tristeza...


Foi triste perceber que meu vôo não poderia ser feito no teu céu...
...Que minha música jamais seria revelada em tua sinfonia...
...Que minhas cores dificilmente seriam vistas no teu arco-íris...
...Que meu cheiro  nunca seria exalado em teu jardim...
Nem meu reflexo visto em teu olhar...

Karla Morgana

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Recolhimento






"Às vezes é preciso recolher-se. O coração não quer obedecer, mas alguma vez aquieta; a ansiedade tem pés ligeiros, mas alguma vez resolve sentar-se à beira dessas águas. Ficamos sem falar, sem pensar, sem agir. É um começo de sabedoria, e dói. Dói controlar o pensamento, dói abafar o sentimento, além de ser doloroso parece pobre, triste e sem sentido. Amar era tão infinitamente melhor; curtir quem hoje se ausenta era tão imensamente mais rico. Não queremos escutar essa lição da vida, amadurecer parece algo sombrio, definitivo e assustador. Mas às vezes aquietar-se e esperar que o amor do outro nos descubra nesta praia isolada é só o que nos resta. Entramos no casulo fabricado com tanta dificuldade, e ficamos quase sem sonhar. Quem nos vê nos julga alheados, quem já não nos escuta pensa que emudecemos para sempre, e a gente mesmo às vezes desconfia de que nunca mais será capaz de nada claro, alegre, feliz. Mas quem nos amou, se talvez nos amar ainda há de saber que se nossa essência é ambigüidade e mutação, este silencio é tanto uma máscara quanto foram, quem sabe, um dia os seus acenos."
Lya Luft



terça-feira, 6 de setembro de 2011

canção





Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar


Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.


O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...


Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.


Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

Cecília Meireles

Mergulho


Me perco nos teus olhos... e mergulho sem pensar...se voltarei... (M.E.)










sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Eu me prometo...



...Ler mais livros, ouvir mais músicas(inclusive infantis),dormir sem culpa(quando der),comer brigadeiro de colher quando sentir vontade e não ficar com remorso,contar até dez antes de(...), ir mais ao cinema,ser menos crítica(vou me esforçar), rir mais com meus filhos, sentir mais cheiros, ver mais cores,ir mais à museus/cafeterias/exposições, contemplar mais o horizonte, admirar mais a eternidade/profundidade e inteligência de Deus e em Deus, mascar chicletes de canela,escrever mais,caminhar,ouvir mais os passarinhos, estudar filosofia/sociologia/antropologia, mergulhar mais e mais na poesia,cantar mais, tocar mais violão, sorrir, agradecer,oferecer,ajudar...
...Experienciar...Experimentar...Esperançar... 

Karla Morgana